A quem interessar, segue o manifesto encaminhado ao CMDUA em 20 de maio de 2014.
Não se trata da crítica pela crítica, se trata, isso sim, de uma preocupação crescente de uma urbanista convicta, cada vez mais preocupada com os descaminhos da nossa cidade.
Ao CMDUA
Como delegada da Região de Gestão
de Planejamento 1, encaminho a presente manifestação para que possa ser lida
pelo Conselheiro da Região no CMDUA, com o devido apoio dos meus colegas
delegados, que estão a par da presente manifestação.
Peço aqui aos senhores um pouco
do seu tempo, um pouco mais de 3 minutos. Refere-se à falta de esclarecimento
que se furtaram a dar ao conselheiro da região 1.
Há tempos ando observando que a
pressa vem roubando a qualidade de vida. A pressa na verdade vem roubando a
vida das pessoas. Poucas semanas atrás, um cobrador de ônibus esfaqueou 2
passageiros aqui em Porto Alegre. O motivo, os passageiros reclamavam do atraso
do ônibus. O cobrador, nada tinha o que fazer. O trânsito está caótico. Basta
sair às ruas para ver. Não era culpa dele. Mas ainda sim, as pessoas estão
doentes. Todos estão doentes. Incluindo nós aqui do CMDUA, que na pressa de
aprovar não estamos nem vendo o que estamos aprovando.
No último dia 29, em abril de 2014,
fui como delegada da Região de Gestão de Planejamento 1 ao Conselho do Plano
Diretor, o CMDUA, acompanhar a votação do projeto de ampliação do Shopping
Moinhos de Vento. De início estranhei quão poucos membros da comunidade estavam
lá presentes. Depois viria a compreender, da forma mais decepcionante, o
porquê.
A votação do projeto já tinha
sido levada ao CMDUA, quando o relator, representante da Região 2 de Gestão de
Planejamento tinha votado contra o projeto. Quando isto acontece, o projeto é
redistribuído... até aprovar. Em Porto Alegre, não existe o “não dá”. O
conselheiro da Região 1, que é a região onde se encontra o empreendimento,
havia informado que a comunidade não era contra o projeto, mas sim contra as
contrapartidas determinadas e a forma de condução do processo. E pedia para
tanto um estudo de vizinhança. Este sim, nunca regulamentado, apesar da
necessidade alarmante de sua implantação.
Na reunião do dia 29, novo
relato, desta vez pela aprovação, afinal “a CAUGE já havia dado parecer favorável”.
Mas se este fosse o parâmetro, então por que existir o CMDUA? O CMDUA existe
justamente para questionar e fiscalizar, e isto eu realmente não vi. Preferia
ter ouvido do relator que ele concordava com a CAUGE e não que ele não se
julgava capaz de questioná-los.
Após o relato, o presidente do
CMDUA (Secretário de Planejamento) sequer deu espaço para os poucos
representantes do Movimento Moinhos Vive manifestarem sua opinião. Seria o
mínimo para uma democracia. Mas no conselho, a democracia foi “patrolada” pela
PRESSA dos conselheiros, para literalmente se “livrarem” dos processos. O
Conselheiro da Região 1 ingenuamente fez uma pergunta sobre a Área Livre
Permeável. Na reunião anterior sobre este mesmo assunto, informaram não poder
responder pois era assunto da SMAM e seu representante não estava presente.
Desta vez, o conselheiro da SMAM estava presente mas informou não ser com ele e
sim com o representante da SMURB. A SMURB por sua vez não respondeu... Estava
fazendo outra coisa... o representante saiu da sala como se não fosse com
ele... e sequer deram uma justificativa, uma resposta, nem que sim, nem que
não, nem que talvez. Simplesmente NÃO RESPONDERAM NADA.
Na pressa de votar, a grande
maioria aprovou esta ampliação. O conselheiro da própria região 1 parecia
não acreditar no fato de que não era merecedor de uma mínima resposta. Eu mesma
não acreditei que esta era a forma de condução dos projetos no CMDUA. O grupo
do Moinhos Vive tentou se manifestar e recebeu uma solicitação para que
"ficassem quietos". Sinceramente, ultrajante.
Chocada pela forma de tratamento,
não percebi a velocidade de apresentação do empreendimento proposto junto ao
Barra Shopping. Apresentado tão as pressas que sequer pudemos compreender ao
certo o que se quer no local. Deste, só entendi os 80 metros de altura, e
perguntei a mim mesma sobre seu impacto sobre a paisagem. Apenas eu, por que os
demais pareciam estar lá se enganando ao ouvir que seria um empreendimento
“ecologicamente correto”. E que por isso deveria ser aprovado. Há anos atrás
ouvi este mesmo discurso do projeto Gigante para Sempre do Sport Clube
Internacional. E hoje, o que temos lá? Piso impermeável, entulhos sem nenhum
responsável... aliás, parece que ninguém mais é responsável pelo o que faz.
Sempre considerei o CMDUA como um
espaço democrático. Hoje, estou realmente duvidando disto. Aprovam-se projetos
de impactos significativos, de grande porte, com maior velocidade do que se
aprova uma simples residência. Alguns empreendimentos têm várias medidas
mitigatórias ou compensatórias, outros, quase nenhuma. O CAOS das ruas é o
reflexo disto, desta disparidade. Não nos deixam conferir as informações, os
estudos. Sob a alegação de incapacidade técnica, nos furtam o nosso direito
mais básico de questionar. E quando somos técnicos e questionamos aspectos
técnicos, o silêncio é a maior afronta, que passa desapercebida por muitos.
Cada um que votou a favor dos
grandes empreendimentos sem um estudo decente, cada um que minimiza os impactos
de um grande empreendimento, cada um que acha que tudo é possível , no fundo,
co-autor de todos os crimes e acidentes que ocorrem nesta cidade. Gente
morrendo nas calçadas, pessoas atropeladas, ciclistas mortos... estamos
promovendo o caos. Cada um de nós. Onde está o estudo da Ampliação do Shopping
do Iguatemi?
Isso sem falar as decisões
antagônicas? No centro, vamos aumentar as calçadas, e reduzir o tráfego de
veículos. No Moinhos de Vento (lugar lindo pelas suas calçadas bem cuidadas),
vamos reduzir calçadas, vamos destruir a sua ambiência. No Petrópolis,
manutenção de casas antigas com alguma qualidade. No Jóquei, lugar de um dos
mais importantes exemplares modernistas, ninguém avalia o impacto do novo
empreendimento sobre o exemplar. Dá pra entender? Não, não dá. E quando eu digo
nós, é por que quando calamos, concordamos. E aqui, no CMDUA, parece que todos
concordam.
Está chegando, porém, o dia em
que a falta de planejamento vai realmente custar caro. Pois até então estávamos
falando de obras. E hoje, falamos de vidas. Novamente afirmo, estamos
promovendo o caos. Estamos apoiando o gasto de recursos em obras inúteis
enquanto o povo sofre sem ter condições mínimas de saúde e de educação. Estamos
vivendo num mundo de faz-de-conta, mas o faz-de-conta está sumindo pelo aumento
da violência. E entre idas e vindas, gasta-se 1 milhão de reais em um chafariz
seco que ninguém vê, que ninguém usa. Esta é a nossa Porto Alegre.
Eliana Hertzog Castilhos
Delegada RP1
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